Veredito de Judas e o Messias Negro

25/04/2021 - POSTADO POR EM Filmes

Indicado ao Oscar de Melhor Filme, Judas e o Messias Negro conversa historicamente com outro concorrente na mesma categoria da premiação. Os Sete de Chicago traz Yahya Abdul-Mateen II no papel de Bobby Seale, co-fundador do Partido dos Panteras Negras, enquanto o filme de Shaka King traz Daniel Kaluuya no papel de Fred Hampton, presidente da filial de Illinois do Partido. Ambos os filmes retratam acontecimentos reais do final dos anos 1960. Com 6 indicações ao Oscar 2021, Judas e o Messias Negro é um dos grandes filmes do ano. Confira o veredito a seguir.

A luta por direitos

William O’Neal (Lakeith Stanfield) é um golpista que se passa por agente do FBI para “confiscar” bens que na verdade ele está assaltando. Numa ocasião em que seu método dá errado, ele é interceptado pelo FBI de verdade e é recrutado para se infiltrar no Partido dos Panteras Negras em Illinois, presidido na época por Fred Hampton, com o objetivo de extrair informações e ajudar na derrubada da organização.

Retratando a história real de como Hampton foi traído por O’Neal, informante do FBI, Judas e o Messias Negro começa acertando já em seu título, uma vez que diversos paralelos podem ser traçados entre a trajetória do caso com a do relato bíblico da traição de Cristo por Judas.

Imagem: Divulgação

Panteras Negras

Para compreender o contexto histórico do filme, é importante conhecer sobre a organização dos Panteras Negras, que em sua origem surgiu com o intuito de combater a brutalidade policial na Califórnia através de patrulhas civis armadas, até ampliar sua atuação para um braço de assistência social, oferecendo suporte a população negra (que era recriminada e marginalizada pela política) nos EUA. Eventualmente, o partido se tornou uma organização internacional muito bem estruturada, o que assustou o governo estadunidense.

Com um um discurso anti-racista e revolucionário, e envolvendo-se em conflitos armados que mataram tanto policiais quanto militantes do partido, os Panteras Negras passaram a ser associados pela mídia à violência, mas durante sua atuação promoveram assistência jurídica, educacional, e de saúde, abrindo clínicas gratuitas nas comunidades e oferecendo cafés da manhã para crianças em situação de pobreza. Minado com ataques incessantes e clandestinos pelo FBI, somados à dissolução da diretoria em meio a escândalos de agressão e corrupção, o partido perdeu força e chegou ao fim no início da década de 1980.

Fica a dica: para quem quiser conhecer mais sobre a trajetória do Partido dos Panteras Negras, recomendamos o episódio especial sobre o assunto do Podcast “Negro da Semana”, do escritor Alê Garcia. Você pode acessá-lo clicando neste link.

Imagem: Divulgação

Um passado ainda presente

Apesar de este ser seu segundo longa-metragem, Shaka King conduz a produção com o pulso firme de um veterano. O tom imprimido pelo diretor e co-roteirista ajuda a manter uma atmosfera de tensão enquanto acompanhamos O’Neal conquistando a confiança de Hampton e em momentos em que seu status de agente duplo pode ser descoberto.

A fotografia de Sean Bobbitt colabora com o senso de urgência que muitas cenas pedem e estabelece uma paleta de cores frias (também reforçada na pós-produção) bastante consistente ao longo do filme.

Ao focar em um capítulo particular da história apresentada, o longa não se aprofunda em uma história maior do movimento, mas tenta equilibrar as trajetórias de seus dois protagonistas. Mesmo com todo um avanço de representatividade, é importante notar que muitas das lutas retratadas continuam extremamente atuais, como observado nos desdobramentos do movimento #BlackLivesMatter.

Imagem: Divulgação

Veredito

Dando espaço para cenas individuais tanto de Fred Hampton quanto de William O’Neal, o filme permite que ambos os atores principais trabalhem a construção de seus personagens. Stanfield convence como um agente tentando sempre esconder seu nervosismo – e deixando que ele fale mais alto em algumas cenas de destaque. Kaluuya, apesar de lhe ser exigido um alcance menor, está perfeitamente escalado como um líder firme e que conquista a admiração de seus colegas de luta, impondo respeito na tela.

Ao tratar de um assunto que tem sua porção de controvérsias, o trunfo de Judas e o Messias Negro está em não tomar um partido claro, deixando que o espectador faça isso por conta própria. Seriam as ações de O’Neal justificadas? O desfecho da história da vida real, trazido pelo filme em cartelas durante os créditos, traz alguma indicação de resposta para esse questionamento, mas que pode divergir sob diferentes óticas.

Pontos fortes

  • Elenco em ótima forma
  • Roteiro e direção consistentes
  • Apresenta dois lados da história

Pontos fracos

  • Requer um conhecimento prévio do movimento para maior efetividade

Nota: 8,2