O Formidável – A história de Anne e Godard

26/10/2017 - POSTADO POR EM Filmes

Aproveitando para homenagear Godard enquanto este ainda vive, Michel Hazanavicius, o diretor do premiado “O Artista” (2011),  lança agora “O Formidável” – filme que conta a história de amor entre Godard e Anne, baseado na obra autobiográfica da ex-esposa do diretor, “un an après” (2015).

Muitos conhecem Anne Wiazemsky (1947-2017) como a ex-esposa e musa do cineasta Jean-Luc Godard, contudo, como muitas outras figuras históricas femininas, ela existe fora da sombra de um homem, por mais impressionante que isso possa parecer! (é uma ironia)

Anne

Atriz, Anne (Stacy Martin) participa do longa “A Chinesa” (1967), de Godard (Louis Garrel). É durante as filmagens que ela se encanta pelo cineasta – à época, já considerado um gênio. Casam-se imediatamente.

Vemos os desgastes da relação amorosa entre a artista e seu esposo: o gênio detestável de um homem que não consegue poupar à ninguém em sua crise (enquanto pessoa e enquanto artista – Godard entraria profundamente numa fase revolucionária de sua obra). O filme tem como ponto principal a mudança do ponto de vista de Wiazemsky sobre seu marido: do cineasta empolgado com sua arte ao marido abusivo e homem comum. Narrado pelos dois (e às vezes por uma terceira voz), desde seu início anuncia a tragédia da vida mundana; pessoas amam e deixam de amar.

Foto: Divulgação

Apesar da fabulação de uma situação atual, vemos em “O Formidável” uma história extremamente verossímil – os pedidos do marido para que a esposa não aceite um emprego x, o cerceamento da individualidade da mulher, o devir-patético (risos #George) dos homens de meia-idade e outras coisas que lentamente destroem aquilo que um dia convencionou-se chamar Amor.

Foto: Divulgação

Homenagem técnica

Do ponto de vista técnico, o longa é bastante influenciado pela estética da nouvelle vague (escola cinematográfica de origem francesa), mas de maneira bem humorada. Talvez haja alguns excessos, mas nada de muito grave. Explica-se: Hazanavicius utiliza todo o arsenal de elementos do cinema godardiano para florear sua história. Sons que caminham da diegese (aquilo que ocorre no universo narrativo atualmente, como o som de um telefone tocando) para não-diegese (como a trilha musical que apenas o espectador ouve), frames pausados, o uso do negativo e a relação som-imagem são bem explorados. Não é genial, mas não ofende – a obra homenageia o cinema francês da década de 60 e faz isso bem.

Foto: Divulgação

Veredicto

Vale a pena assistir o filme de Hazanavicius; é uma ficção que, pelo menos um pouco, tira nossa fé de um ídolo e revela um sentimento que se esconde muito suave dentro de nossas cabeças – a desilusão. Anne é uma personagem incrível e que, se passa considerável tempo do longa calada, nos informa muito mais do que os verborrágicos homens ao seu redor. A atriz, personagem real da história, morreu dia 5 de outubro deste ano. Deixou uma vasta obra literária, bem como atuou em diversos longas (de diversos diretores). Seu muso – pelo menos durante o tempo em que ela o amou – segue vivo, com 86 anos.

Foto: Taste of Cinema