Após o sucesso na temporada de premiações, o estúdio A24 lançou na última semana uma nova minissérie, agora em parceria com a gigante Netflix. 

Treta é uma tragicomédia de 10 episódios que fascina pelo equilíbrio entre o drama e o humor, sob a direção de Hikari e de Jake Schreier, com produção de Lee Sung Jin. Vamos discutir.

Aquele pequeno empurrão

Há dias que nossa única vontade é que ninguém nos dirija a palavra. E nesses períodos de instabilidade, não é difícil tomar decisões que acarretem em um polvoroso efeito dominó. 

Treta se propõe, basicamente, a estabelecer uma reação em cadeia descontrolada causada pelos protagonistas Amy (Ali Wong) e Danny (Steven Yeun). Tudo por um desentendimento em um estacionamento que uniria suas bem distintas trajetórias.

Enquanto Amy é uma empreendedora de sucesso prestes a faturar milhões vendendo sua empresa para curtir o resto da vida com o marido e a filha, Danny é um faz tudo que tenta comprar uma casa para seus pais sul-coreanos e que mora junto de seu irmão mais novo.

Embora os perfis não se relacionem, ambos possuem os combustíveis necessários para pendular entre o sarcasmo e o trágico: raiva internalizada e o manejo para manipular essa emoção em qualquer cenário. Logo no 1º episódio isso é escancarado pela qualidade das performances da dupla principal. 

Amy se esconde atrás da máscara de esposa zen e da empresária confiante, quando o que mais espera é uma oportunidade para externalizar suas decepções acumuladas sem julgamento dos próximos.

Já Danny mantém a postura simpática de um astuto trabalhador apesar da pouca experiência, enquanto busca convencer seu irmão, Paul (Young Mazino), – e a si mesmo – a acreditar em seus projetos para garantir o sustento da casa e guardar dinheiro para um terreno.

Cascata sem fim

A briga no trânsito se retroalimenta e evolui para patamares que não vou expor aqui pois spoilers. Porém, a questão que sempre surge ao longo dos 350 minutos é: até que ponto um estresse inesperado, como uma buzinada, pode desencadear uma resposta tão moralmente exagerada?

A minissérie busca justificar essa pergunta de diversas formas: a sutil, como a inveja entre os irmãos, e a afrontosa, como a curiosidade por outros corpos. 

Seja qual for a maneira de explorar esses excessos, a obra quase nunca se apressa para progredir à uma nova etapa da encruzilhada. O episódio do encontro em Las Vegas, por exemplo, toma muito tempo para apreciar uma pausa tranquila durante uma crescente de tensão da história. 

Ou seja, até nos momentos mais ansiosos, principalmente após os erros, é possível achar alegria, para depois encará-los de frente. A primeira cena de Danny na igreja resume bem essa ideia.

Veredito

Treta é de fácil conexão pelo modo simples como aborda os mesmos desejos repreendidos em realidades tão separadas. A edição rápida nas sequências cômicas e a paciência adequada durante as cenas de drama marcante contribuem para um produto pé no chão.

As interpretações de Yeun e de Wong surpreendem, para o que seria, no fim das contas, uma obra voltada, no início, ao humor pela tragédia. Apesar da escala que chegam de autodestruição, seus personagens transparecem de forma crua o que qualquer um almeja: reconhecimento de seus valores e oportunidades para crescer como pessoa.

Pontos negativos:

• Episódio final decepcionante pelo andar da carruagem

Pontos positivos:

• Química encaixada entre Yeun e Wong
• Edição paciente nos devidos momentos

NOTA: 8/10