A temporada de premiações do cinema sempre esquenta a partir de dezembro, quando os estúdios lançam suas apostas para o Oscar no começo do ano seguinte.
A Netflix não perdeu tempo e já disponibilizou uma de suas grandes fichas para concorrer às estatuetas: Ataque dos Cães, dirigido por Jane Campion e estrelado por Benedict Cumberbatch, certamente será lembrado nos próximos meses, como evidenciado pelas 7 indicações ao Globo de Ouro que o filme recebeu. Você confere abaixo o que achamos desse sério candidato às premiações.
Oeste nem tão velho
Apesar de, a princípio, parecer um longa estilo Velho Oeste clássico, Ataque dos Cães não chega nem perto do estereótipo de homens em conflito com rápidos revólveres.
Phil (Cumberbatch) e seu irmão George (Jesse Plemons) vivem em um rancho no interior dos EUA. Quando George se envolve de forma amorosa com a dona de um restaurante, Rose (Kirsten Dunst), o irmão não esconde a desaprovação nem para a nova cunhada, nem para o filho dela, Peter (Kodi Smit-McPhee).
A grosseira atitude de Phil sobre os novos membros da família o afasta de seu irmão e gera um conflito internalizado com Rose. A base para o desenvolvimento da obra, adaptada do livro homônimo de Thomas Savage, é posta logo cedo para uma incessante “torta de climão”.
Inimiga da pressa
Campion não faz questão de ditar um ritmo engajante pela primeira hora de filme. A pesada tensão entre Phil e Rose abastece um combustível que nunca explode, sempre gatilhado nos menores gestos, cheios de ciúmes e de inveja por parte do imponente vaqueiro.
Essa postura intransigente de Phil atravessa também pela trilha sonora assinada por Jonny Greenwood, talvez o melhor elemento do longa. Construída toda por instrumentos de corda, a trilha característica do personagem é marcada por violinos/cellos com potentes e longos graves que contrastam com o leve e agitado piano característico de Rose, que perde o controle de sua sinfonia conforme a personagem cai no poço. A cena do banjo versus piano é o exemplo claro de dominância sensorial de Phil sobre a frágil cunhada.
A falta de velocidade no momento inicial é uma escolha estilística compreensível para a história trabalhada. Não agrada a todos – meu caso – e dificulta a doação completa do público à trama.
Conclusão merecida
A relação entre Phil e Peter é a mais interessante do filme. O desgosto inicial do tio pelo jeito mais sensível e quieto do jovem vai, aos poucos, se transformando em entusiasmo para impor as “maneiras de um homem de verdade”.
A inimaginável amizade dos dois faz paralelo à do amigo/ídolo falecido de Phil, que vê no sobrinho a chance de ser herdeiro de seus aprendizados como cowboy. Uma promessa de Peter, logo no começo do filme, é esquecida durante essa aproximação com o então “vilão” e inimigo de sua mãe.
Porém, a mesma promessa é logo resgatada nos minutos finais de Ataque dos Cães, daqueles nos fazem soltar um riso de surpresa e de admiração por quebrar totalmente a expectativa sobre um personagem, a princípio, inofensivo. Uma martelada brutal para fechar a obra no ponto alto.
Veredito
Ataque dos Cães será lembrado como o longa mais desafiador de Cumberbatch até hoje. A ira e, por que não, a paixão de Phil como homenzarrão do campo, fixam, com méritos, os holofotes do filme de Campion.
Quanto mais reflito sobre a construção visual e sonora dele, melhor fica. Embora a primeira metade seja complicada, o resto compensa pela dinâmica de trégua momentânea entre dois homens com intenções bem distintas.
Ótima carta da Netflix para o Oscar. Feito na medida certa para as premiações.
Pontos negativos
- Primeira hora lenta, difícil de manter o foco
Pontos positivos
- Trilha sonora de cordas casa perfeitamente com os conflitos
- Final surpreendente pela construção
Nota: 7,5