O diretor brasileiro Sérgio Machado, responsável pelo aclamado Cidade Baixa (2005), acaba de lançar nos cinemas O Rio do Desejo (2022), seu novo e premiado filme cuja trama é uma adaptação do conto Adeus ao Comandante, do autor amazonense Milton Hatoum.
Fomos convidados para assistir o filme em uma pré-estreia especial e contamos nossas impressões a seguir.
Enredo
Anaíra (Sophie Charlotte) é uma jovem atraente que acaba conhecendo o policial Dalberto (Daniel de Oliveira). Os dois se apaixonam e isso leva o rapaz a largar o seu trabalho e assumir o comando de um barco que fazia a travessia do Rio Negro. Anaíra vai morar com Dalberto e seus dois irmãos e acaba tendo que ficar sozinha por quase 2 meses com eles, o que acaba despertando desejos carnais em todos.
A trama é uma adaptação de um conto presente em uma coletânea de contos, onde, no livro, os outros textos estão diretamente ligados a ele, ajudando o entendimento da história e dos personagens. E é aqui que mora o problema da adaptação. Por mais que o diretor e a roteirista tenham se empenhado em transformar uma obra escrita para a tela, em alguns momentos sentimos a impressão de que falta algo. Por exemplo, o sonho de Anaíra de ir curtir uma noite, acabou ficando vago e causando a impressão de ela ter esse desejo apenas por ser uma jovem humilde mas com ambições fúteis.
Apesar deste problema, o texto consegue entregar uma dúvida de quem é vilão ou mocinho durante todo o longa. Esse é o tipo de roteiro em que vemos personagens humanos, cada um com suas falhas e qualidades. Em nenhum momento torcemos para a mesma pessoa, com as opiniões da audiência sempre oscilando. Além disso, é necessário destacar a atuação maravilhosa de Sophie Charlotte, que às vezes apenas com um olhar entrega muito do que está sentindo.
Imagem: Divulgação
Cinema Brasileiro
É nítido que nos últimos anos o cinema nacional sofreu muito com os cortes de desincentivos à cultura. É difícil ver um filme brasileiro passar mais de uma semana em cartaz em vários cinemas pelo Brasil. Além disso, as leis de fomento ao audiovisual nacional não têm sido respeitadas e a indústria encontra brechas para que estas sejam burladas.
As dificuldades enfrentadas pela produção de O Rio do Desejo são um exemplo do sucateamento das políticas de fomento ao audiovisual brasileiro. Segundo o diretor Sérgio Machado, o projeto venceu um edital em meados de 2012 e conseguiu receber o investimento necessário. Porém, quando entrou em sua fase de pré-produção, já em um novo governo, o filme sofreu com cortes e dificuldades burocráticas. Nos últimos dias de gravação, a equipe já estava bem reduzida, entre outras dificuldades técnicas.
É evidente que novas produções brasileiras precisam surgir e ganhar mais notoriedade pelo público, porém para isso é necessário que o espectador comece a se interessar mais pelo próprio cinema e assim incentivar sua produção.
Imagem: Divulgação
Veredito
O Rio do Desejo é um filme interessante que desperta curiosidade em saber mais sobre cada personagem, já que eles são mais próximos do espectador, com conflitos e defeitos. Entretanto, o roteiro em alguns momentos deixa isso de lado, talvez por pegar apenas um texto dentre uma coletânea que se complementa.
Além disso, existe uma subtrama relacionada à mãe dos irmãos que precisa muito de um complemento. A primeira impressão é que a trama está ali apenas para ser um acessório, exigindo um esforço do espectador para encontrar sua serventia. A fotografia do filme, por sua vez, é simplesmente incrível, com locações no próprio Rio Negro e em outros pontos de tirar o fôlego. A paleta de cor meio estourada em algumas cenas remete ao analógico e acaba mexendo mais ainda com a emoção do espectador.
Por fim, em meio a um brilhante elenco que casa perfeitamente com os personagens, o grande destaque vai para Sophie Charlotte, que interpreta uma mulher extremamente sensual sem objetificação nenhuma, mostrando doçura e ingenuidade nos momentos certos.
Pontos positivos:
- Direção firme
- Fotografia deslumbrante
- Elenco acertado
Pontos negativos:
- O roteiro traz momentos em que a trama parece precisar de mais elementos para ser sustentada e compreendida
- Subtrama excessivamente subjetiva
Nota: 8,5